"Um médico que convive com HIV", por Almir Santana

Dia 01/12 celebra-se o Dia Mundial de Luta contra a AIDS. No estado de Sergipe, não há figura maior que atue na área de prevenção, informação e combate à AIDS do que o médico Almir Santana, gerente do programa estadual de DST/Aids. Sendo assim, o portal ITnet, através da coluna Saúde Legal relata um texto assinado pelo médico onde há relatos de sua experiência profissional com a doença. "Em 1985, comecei a trabalhar na rede pública, como sanitarista, em um dos bairros mais carentes. Fazia trabalhos de prevenção na comunidade, principalmente sobre as DST. Naquela época não se falava em Aids. Em 1987, chegou ao nosso Estado uma pessoa oriunda de São Paulo e que foi considerada a primeira pessoa com Aids. Foi um pânico na cidade do interior onde ele foi morar. A pessoa tinha Aids e Tuberculose Pulmonar. Na época, muitos médicos rejeitaram o atendimento a esta pessoa, alegando medo de "se contaminar por essa nova doença". Em uma das unidades de saúde onde foi atendido, os funcionários incineraram até a cadeira em que a pessoa sentou. Neste momento, fui convidado pelo Secretário de Saúde para realizar acompanhar este paciente. Prontamente aceitei. Tentei internar o paciente e os hospitais também rejeitaram. Infelizmente, ele foi a óbito. Sofri muito com a sua morte e decidi encarar um novo desafio: A luta contra o preconceito e a discriminação com relação àquela doença nova. No segundo caso de Aids do Estado, também vindo de São Paulo, necessitava de assistência hospitalar. Enfrentei inúmeras dificuldades até que o internei no principal Hospital Geral do Estado. Naquela época, os pacientes ficavam verdadeiramente isolados. O meu nome começou a ser divulgado na imprensa e as pessoas começaram a me chamar de "Dr. Aids". Eu era Clínico Geral e tinha um consultório particular. À medida que eu era exposto na mídia, os pacientes assistidos por mim , começaram a desaparecer do consultório. Não mais conseguindo recursos financeiros para pagar o aluguel da sala, tive que desistir do atendimento particular, mas não recuei da luta contra a Aids. A década de 1980 foi muito difícil. As campanhas falavam apenas que "A AIDS MATAVA". O primeiro símbolo mundial, da luta contra a Aids era uma "caveira entre dois corações" , associando o amor à morte. O preconceito e a discriminação eram muito fortes até com os próprios profissionais de saúde que atendiam aos pacientes. Eu não podia ir a um velório pois, a minha presença, para muitos significava que a pessoa teria "morrido de Aids". Quando visitava algum amigo que estava internado em algum Hospital, as pessoas pensavam logo que "ele tinha Aids" . Algumas vezes fui denominado também de "médico das putas" e "médico dos Gays" , por trabalhar na assistência às pessoas que viviam com HIV/Aids. Fui, por várias vezes ,questionado até sobre a minha sexualidade e/ou se eu era soropositivo ou se tinha alguém na família que tinha Aids. Uma das atitudes discriminatórias mais fortes daquela época, vivenciada por mim, foi quando um dos pacientes resolveu retornar para São Paulo e, no aeroporto, o comandante da aeronave da Varig exigiu que eu fizesse um atestado e que o paciente teria que usar máscara para viajar, pois representava risco para os outros. Venho, portanto, contar um pouco da minha história, no início da epidemia da Aids no meu Estado."
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